A autoridade do comandante de uma aeronave para ordenar o desembarque de passageiros agressivos é um tema relevante dentro do Direito do Consumidor e do Direito Aeronáutico.
Essa prerrogativa foi recentemente legitimada em uma decisão da 9ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte, que reforça o papel do comandante como autoridade máxima durante o voo.
Mas quais são as implicações legais dessa autoridade? E como o Código de Defesa do Consumidor (CDC) se aplica a essa situação?
O Caso: Ação de Indenização por Danos Morais
No processo n° 5077870-24.2023.8.13.0024, um casal moveu ação de indenização por danos morais contra uma companhia aérea, alegando ter sido retirado de um voo após um desentendimento com um comissário de bordo.
Segundo os autores, o comissário teria se recusado a ajudá-los a acomodar a bagagem de mão, gerando uma situação de atrito. O desfecho foi a retirada do casal da aeronave por ordem do comandante, com o apoio de um agente da Polícia Federal.
Na audiência, testemunhas confirmaram que o casal se mostrou nervoso e exaltado, comportamento que levou o comandante a entender que os passageiros representavam um risco à segurança do voo.
A juíza Moema Miranda Gonçalves decidiu pela improcedência da ação, sustentando que o comandante agiu dentro de suas prerrogativas legais, visando garantir a segurança de todos a bordo.
A Autoridade do Comandante e o Direito Aeronáutico
O comandante é, de fato, a autoridade máxima em uma aeronave, e essa autoridade se estende à manutenção da ordem e da segurança a bordo. A decisão judicial reafirma que, quando um passageiro apresenta comportamento agressivo ou disruptivo, o comandante tem o direito de ordenar o desembarque desse passageiro.
Essa prerrogativa está prevista no Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), que confere ao comandante a responsabilidade de tomar medidas para garantir a segurança do voo, incluindo a remoção de passageiros que possam comprometer a segurança.
Direito do Consumidor e a Responsabilidade da Companhia Aérea
Do ponto de vista do Código de Defesa do Consumidor (CDC), as companhias aéreas, como fornecedoras de serviços, têm o dever de garantir que seus clientes recebam atendimento adequado e que sua integridade física e moral seja preservada durante o voo. No entanto, o CDC também prevê que o fornecedor pode tomar medidas excepcionais quando houver risco à segurança de outros consumidores ou à prestação do serviço.
Nesse contexto, a atuação do comandante ao ordenar o desembarque de passageiros agressivos pode ser considerada uma medida de proteção à coletividade, conforme o artigo 4º, inciso II, do CDC, que trata da necessidade de equilíbrio entre os interesses dos consumidores e a defesa da saúde e segurança.
Além disso, o artigo 6º, inciso I, do CDC, reconhece o direito básico dos consumidores à segurança, o que reforça a legitimidade da decisão do comandante de remover passageiros cujo comportamento possa ameaçar a integridade dos demais.
Abuso de Autoridade e Limites da Atuação do Comandante
Embora o comandante tenha autoridade para remover passageiros, essa prerrogativa não é ilimitada. Caso haja excesso ou abuso no exercício dessa função, como a remoção injustificada de passageiros, o ato pode ser passível de questionamento judicial.
No entanto, no caso em questão, a juíza entendeu que não houve abuso de autoridade, pois o comportamento do passageiro foi devidamente relatado e confirmado por testemunhas.
Conclusão
A decisão da 9ª Vara Cível de Belo Horizonte reforça a importância da segurança como um valor primordial no transporte aéreo, reconhecendo a legitimidade da autoridade do comandante em situações de conflito.
No entanto, a aplicação do CDC em casos como esse também demonstra a necessidade de equilíbrio entre o direito dos consumidores e a responsabilidade das companhias aéreas em proteger seus passageiros e tripulação.
Este caso serve de exemplo para o debate jurídico sobre os limites da autoridade do comandante e as garantias de segurança que devem ser observadas durante um voo.
Para as companhias aéreas, é fundamental garantir que seus funcionários estejam preparados para lidar com situações de estresse e conflito a bordo, sempre em conformidade com as normas do CBA e do CDC, evitando excessos que possam resultar em futuras ações de indenização.
Por Phelippe Guesser, advogado inscrito na OAB/SC 41791, e Marcos Marcirio Mendes, bacharel em direito.
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Referência: Processo 5077870-24.2023.8.13.0024, da 9ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte.
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